sexta-feira, 11 de março de 2011






 Neste vídeo, dois dos maiores pensadores da segunda metade do século XX, o francês Michel  Foucault (1926-1984) e o estadunidense  Noam Chomsky (1928 -); debatem  e expõe suas ideias vigorosas acerca de temas universais contemporâneos como: estruturas de poder, ideologia dominante, coercibilidade das instituições, hegemonia e desobediência civil. Um dos aspectos interessantes do debate – do ponto de vista filosófico – pode ser notado quando Noam Chomsky defende uma certa concepção pré-determinada e inatista de “natureza  humana”, imediatamente refutada por Foucault, que a questiona magistralmente e coloca em xeque a existência da noção idealista de uma “natureza humana” comum a todas as pessoas, concepção bastante presente nas filosofias dos séculos XVII e XVIII e de modo geral anteriores ao materialismo filosófico (marxiano). Esse conceito fora refutado também por Jean-Paul Sartre (O Existencialismo é um Humanismo) e por boa parte dos pensadores existencialistas, que preferem defender uma ideia de “condição humana”, que seria mais apropriada e adaptada ao historicismo  e às condições materiais-dialéticas de determinada época, tal como as aspirações e anseios das sociedades guiadas por interesses próprios, que caracterizam determinado momento da história da humanidade. Ainda assim, o debate nos mostra a grandiosidade das ideias de dois dos mais influentes pensadores contemporâneos.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

TRABALHO NÃO!


(...)“Daqui há alguns anos iremos estar na faculdade, e depois iremos SÓ TRABALHAR... NINGUÉM ESCAPA!”.

               Foi com essa frase que dias atrás J.H.G, 10 anos, aluno de escola pública, terminou sua redação em uma dessas provas aplicadas pelo governo, cuja sigla mais parece o nome de alguma doença infecto-contagiosa – que convenientemente denuncia o estado patológico que se encontra a educação – tendo em vista que tais métodos avaliativos só tem como finalidade apresentar números e dados irreais em foros e órgãos internacionais, para que parlamentares e toda sorte de demagogos e burocratas digam de maneira superlativamente falaciosa, que o país está avançando em mais esse desafio, eximindo-os de sua real incompetência.  
              Mas voltando ao mote principal desse texto, ao analisarmos a frase do jovem aluno, percebemos sem nenhuma dúvida a que condição fora relegado o trabalho, a atividade humana por excelência segundo Karl Marx, que em sua essência é capaz de fazer com que o homem domine e transforme a natureza de maneira sublime e ainda assim, faça inerentemente parte dela, mas que fora corrompido e subvertido pelo niilismo do sistema capitalista, que sem cerimônia alguma profana tudo aquilo que é sagrado em seu benefício.
             Ao observarmos uma criança de tão pouca idade, referir-se magistralmente ao trabalho de  maneira tão realista e ao mesmo tempo fatalista como a descrita, como algo de que “ninguém escapa”; nota-se que cada vez mais cedo se adquire a consciência de quão funesta fora reduzida essa atividade humana, que dialeticamente fez com que os homens atingissem números de produção e tecnologias jamais imagináveis, mas que, no entanto – através da alienação e da apropriação dessa força por uma dúzia de homens a fim de explorar todos os demais –  sua utilização social remete cada vez mais, de maneira involutiva, ao retorno da raiz etimológica do termo (em latim tripolium) que servia para descrever um antigo instrumento usado para torturar homens. Observa-se então uma espécie de “escravidão consentida” ou travestida de liberdade, que se dá a partir do trabalho e em outras esferas da vida social, como descreve Marx no seguinte trecho:

A escravidão da  sociedade civil (Burgerlichen Gesellschaft) é aparentemente a maior das liberdades, pois parece deixar o indivíduo perfeitamente independente. O que o indivíduo entende como sua própria liberdade é o movimento (não mais refreado ou restringido por um vínculo comum ou pelo homem) dos elementos alienados que compõe sua vida, como a propriedade, a indústria, o religião, na verdade esse movimento é a perfeição de sua escravidão. (p.157 - A sagrada família). 


             Neste caso, o caráter ontológico revolucionário e transformador do trabalho é subvertido, e deixa de ser entendido como algo positivo, transpondo a noção popular de "aquilo que enobrece o homem", passando a ser visto até mesmo  por uma criança como algo que se deva evitar ao máximo. No entanto, toda essa clareza com que se é possível entender a condição estapafúrdia que chegou a exploração de uns homens sobre os outros através do trabalho, abre um caminho extremamente produtivo e sem precedentes na história da humanidade, para que se crie uma consciência de classe radical pelos novos trabalhadores, sendo superada somente através da práxis a condição de coisificação do trabalho e do trabalhador – que servem apenas passivamente de objetos autômatos dentro do processo de produção capitalista – a fim de se atingir o proposito humanista que transformaria o trabalho em algo realmente edificante, como o proposto por Saint-Simon em seu famoso axioma: “de cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades”. 



 


quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

LEGALIZAÇÃO?

Novamente surge nos noticiários manifestações em prol da legalização das drogas. De fato qualquer coisa que tenha uma abrangência social deve ser francamente discutida e debatida, mas nesse caso, acredito que a discussão possa cair como pode se observar, numa especulação de forças nada ocultas (ou seria à toa que até excelentíssimo ex-presidente FHC estaria defendendo essa posição?) e do senso comum pequeno-burguês. Nos meios intelectuais e universitários não é raro encontrar grandes entusiastas pela legalização das drogas e mais especificamente da maconha. A grande falácia nesse ambiente, é colocar essa discussão como sendo uma postura exclusivamente “progressista” e/ ou “moderna”. Essa mesma pequena-burguesia que se situa como “esquerda”, mas que, no entanto, desconhece grande parte do legado teórico marxista, deveria primeiramente atentar para o fato de que ao invés de se incentivar a legalização de qualquer espécie de droga, o coerente seria trabalhar efetivamente para a conscientização dos males causados por todas elas (aqui enquadram-se também tabaco, álcool, etc.), que surgem como artifícios do consumismo, moedas de troca e mercadorias fetichistas do sistema capitalista. Neste caso, as drogas podem servir também como um fator alienante que afastaria o indivíduo de sua essência subjetiva, sendo historicamente mais uma ferramenta formidável apropriada pelo sistema capitalista para inebriar e dominar as massas e as consciências (basta lembrarmos de episódios como a Guerra do Ópio, por exemplo). Esse seria apenas um dos aspectos negativos, devido à complexidade da discussão. Ao alimentar o discurso de que a legalização anularia o tráfico e consequentemente haveria uma diminuição do crime  organizado, também nota-se se aí algumas incoerências e a falta de uma análise dialética mais profunda da realidade, ou por acaso o fato de um CD ou um maço de cigarros serem bens de consumos legais, impedem que esses mesmos artigos sejam sistematicamente pirateados e contrabandeados em grande escala? Uma suposta legalização faria que o governo recolhesse impostos e exercesse um controle rigoroso sobre esse tipo de produto. Até aí nada mal, desde que essa receita gerada fosse usada efetivamente em programas de desenvolvimento social. Nada mal se não estivéssemos no Brasil e não soubéssemos que mais arrecadação também significa mais fontes para a corrupção. Ainda assim, por se fazer necessário um produto com um controle de qualidade rigoroso, logo, este mesmo produto também teria que passar por um processo de industrialização,  e neste caso, quem seria a classe que manteria o monopólio sobre o processo de produção, desde o plantio até o produto final? Obviamente a grande burguesia e o empresariado, que exerceria extrema especulação de mercado em cima do novo artigo de consumo. Nesse sentido, o tráfico como o conhecemos se identifica muito mais com um movimento de resistência lumpemproletário, na medida em que cria um ambiente de tensão social que pode e deve ser assimilado pelas massas como extremamente positivo numa perspectiva de mobilização ou revolução social, capaz de levar a opinião pública a questionar radicalmente as origens mais profundas da violência, que decorrem da maneira arbitrária que a sociedade se organiza para produzir e distribuir sua produção. 
A grande ignorância da discussão pequeno-burguesa nesse sentido é colocar o tráfico como uma causa, quando na verdade é o efeito crônico desse mesmo sistema assimétrico. É criado então um paradigma de criminalização da pobreza. Esse discurso todo de legalização soaria bem menos absurdo se não estivéssemos num país com gravíssimos problemas estruturais e superestruturais que todos já estão cansados de saber, mas que, no entanto precisam de maior urgência e mobilização social em suas resoluções imediatas, como a miséria extrema de milhões e a falência dos sistemas educacionais e de saúde. Ainda assim, para a resolução efetiva destas questões, não se vê um ativismo tão grande por parte da intectualidade e dos representantes da pequena-burguesia, obviamente por esses problemas não os atingirem diretamente, logo, o combatem com doses alopáticas de demagogia.  Ao legalizar outras drogas, ou a maconha (que inegavelmente junto com o tabaco e o álcool podem levar ao consumo de outras substâncias que criam grave dependência) corre-se então o risco de ser gerado também mais um grave problema de saúde pública, que obviamente poderia ser contornado facilmente pela burguesia, pois teriam condições materiais de asilar seus filhos nas melhores clínicas para tratamento e recuperação. No entanto, nas camadas mais populares e vulneráveis da população – alheias a todo tipo de serviços desde os mais básicos – as  conseqüências poderiam ser ainda mais tétricas. Para mais essa forma de discussão de cunho consumista e burguesa, maquiada em um slogan “progressista”, que, no entanto, pode aumentar ainda mais perigosamente o espectro de atuação e fortalecimento do capitalismo, deixo minha opinião: legalização não!


segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

BELICINÍSMO

   
          Nos últimos dias, as ‘belicracias’ Estados Unidos e Rússia aprovaram um acordo de "desarmamento"  em que limitam seu arsenal nuclear à "apenas" 1.500 ogivas cada.  Enquanto isso,  a comunidade internacional continua seu sofisma midiático, tentando fazer-nos acreditar  que o Irã seria  a  grande ameaça mundial em sua suposta quase tentativa de criar uma arma nuclear. Com um aparato tecnológico rudimentar para enriquecer urânio e pouco dinheiro , se verdadeira a acusação  contra a nação iraniana, tal feito só seria possível apenas daqui há uma década aproximadamente, e como produto, o país islâmico teria algo de eficácia e portabilidade baixíssima, algo similar aos ridículos artefatos testados pela Coréia do Norte nos últimos anos. Em suma, o 'belicinísmo' das grandes potências nucleares através de seu terrorismo midiático, tenta nos fazer acreditar que o suposto "trambolho  nuclear" que  supostamente o Irã seria capaz de criar daqui há uns pares  de anos, seja o grande inimigo da paz mundial. Enquanto isso, com a "redução" de seu poderio atômico, as grandes 'belicracias' poderão agora  extinguir o planeta e toda forma de vida existentes, no máximo umas  20 vezes consecutivas.

domingo, 19 de dezembro de 2010

FOMOS ESTUPRADOS!

         
         Nesta semana (na verdade no fim da semana passada), o povo brasileiro se viu mais uma vez logrado. Até aí, nenhuma novidade. Com o silêncio retumbante de um povo cada vez mais covarde e permissivo, num gesto imprevisível, um coup de main¹,  os parlamentares aprovaram sem muito alarde, aumentos generosos de até 75% em seus já onerosos salários, aumentando ainda mais a distância material, ética e simbólica entre nossos mandatários (aqueles que tudo podem) e a manada omissa que tem como direito obedecer e concordar cegamente com qualquer medida arbitrária vertical. Um estupro! Um verdadeiro estupro moral ocorreu novamente contra o povo brasileiro. Mas seria de fato um estupro? Um estupro ocorre como um ato de violação grave contra a integridade de outra pessoa. No caso em questão, o povo “moralmente estuprado” se sentiu de fato lesado? Neste caso, o problema encontra-se na passividade. Quando não se proíbe uma prática ou a condena, consequentemente a legitima e a estimula. Dessa forma, damos o aval para que ocorra a moralização daquilo que agride e vai contra uma postura ética que anseia a nossa esgarçada sociedade. 
        Sobre as reações, com excessão de um único partido político minoritário que se opôs à medida, oque  acompanhei foram  apenas manifestações isoladas e esparsas de indignação (como esta minha) à revelia da grande massa e da grande mídia. Não observei nenhuma movimentação expressiva que contestasse efetivamente a medida parlamentar, sequer pela Intelligentsia ou pelos representantes da auto-proclamada “esquerda”, que em geral vão muito bem, obrigada. Aliás, estamos perto das comemorações de fim de ano, e bem sabemos que a “esquerda” brasileira (que adora fazer festa), não iria anular sua agenda em detrimento de interesses “menores”. O que notamos então, tal como um câncer que extirpado de um órgão já age de maneira mais avançada sobre outro, é que quando começa-se a falar quase que diariamente em combate a corrupção, eis que aqueles que a praticam - daqui a bem pouco tempo - sequer precisarão se arriscar mais nessa prática, poupando-se de serem vítimas de eventuais denúncias ou penalidades que poderiam colocar suas "imaculadas" carreiras em xeque, pois já será possível aprovar mecanismos para substituir a corrupção ortodoxa por uma “legal”. Impensavelmente na última semana  vimos surgir então o princípio da “institucionalização da corrupção”. Quem sabe daqui há algum tempo, com as coisas caminhando dessa forma, alguma medida provisória ad aeternum a possa legitimar de vez. Eu  e o povo brasileiro mais uma vez fomos estuprados!           


1-Expressão usada por Karl Marx, em “18 Brumário de Luís Bonaparte" para descrever o ataque inesperado de Luís Bonaparte, que se efetivou em golpe de estado na França em 1948.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

SER ou TER? FAZER!


 
Uma discussão bastante atual, ouvida, repetida e pronunciada tanto nos meios intelectuais como nos de cultura de massa, coloca em oposição duas premissas que atingem intimamente os valores do indivíduo, sobre o que seria mais importante para este em sua relação com a sociedade, modificando e transformando a famosa incógnita shakespeariana e dando a ela uma roupagem pós-moderna extemporânea: “ser” ou “ter”? Eis a questão!
Para começar a desenvolver essa discussão, entraria em campo primeiramente aquilo que o indivíduo consideraria fundamental para a construção de seu “ser social”, se aquilo que possui (nesse aspecto, se mencionaria suas aquisições e posses materiais, mercadorias, bens de consumo, etc.) ou aquilo que ele é de fato (valores imateriais como conduta, caráter, sentimentos, preceitos éticos, etc). O corrente e comum que se ouve como resposta quando mencionado tal questionamento – tanto para aqueles que se põe a criticar os costumes e padrões socialmente estabelecidos, como por aqueles que de maneira acrítica pegam carona naquilo que é ou acaba por transformar-se em senso comum – seria afirmar a predominância absoluta do “ser” sobre o “ter”. A partir desta afirmação é possível surgir então um novo questionamento: O que determinaria o “ser”? Uma das afirmações básicas de Karl Marx dentro de seu pensamento se opôs radicalmente contra o idealismo dominante do século XIX. Nesse sentido o filósofo afirma que: "Não é a consciência do homem que determina seu ser, mas é seu ser social que determina sua consciência", contrariando  o  que afirmava Hegel e outros filósofos idealistas. Então seria um erro primário e de certa forma sofismático, correndo-se o risco de um retorno ao pensamento idealista superado por Karl Marx, concordar com o senso comum de que o “ser” seria mais importante que o “ter” sem antes fazermos uma análise crítica dessas duas condições e como uma age sobre a outra. Obviamente que na sociedade capitalista o “ter” lamentavelmente transformou-se em um conceito negativo, que passa a ser entendido quase que exclusivamente numa premissa de conotação pejorativa e fetichista do capitalismo, onde os objetos de consumo adquirem um valor autônomo, uma aura sobrenatural então se instala sobre eles fazendo que seu valor real não tenha origem ou explicação racional e sim absurda, assim como o desejo massivo (numa forma nefasta de consciência coletiva) de se consumir essas determinadas mercadorias.
No entanto, se analisado sob outras perspectivas, o fator “ter” pode significar e esclarecer muitas coisas nesse questionamento. Com pouco esforço podemos chegar facilmente a conclusão através de uma formulação elementar de que para um indivíduo conseguir um nível excelente de autonomia, é preciso dentre outras coisas, “ter” um bom nível de educação, estímulos cognitivos e conhecimentos de diversas áreas (que lhe são introjetados a partir do meio externo). Ora, para se atingir esse estágio, este mesmo indivíduo deve “ter” (ou ter tido) condições materiais favoráveis que proporcione esse desenvolvimento (por exemplo: bons livros, professores, acesso a diversas formas de manifestações culturais, boa alimentação, moradia, etc.). Concordando com isso, podemos afirmar então que o “ter” (no sentido de “ter” condições favoráveis) tem um papel fundamental na construção do “ser”. No entanto, se faz necessário ainda, que o “ser” se afirme como tal e transcenda o mero “existir” (condição objetiva de qualquer coisa real) tornando-se um “ser” de fato.
Dentro de uma perspectiva materialista histórico-dialética, surge então uma terceira premissa (quase sempre esquecida) capaz de transcender, suprimir e tornar inteligível a íntima e complexa relação e interpenetração das duas premissas citadas anteriormente: o “fazer”.    Nesse caso, o “fazer” seria a atividade que legitimaria e afirmaria o “ser social". Ainda segundo Karl Marx, o trabalho e a realização por meio da práxis são as atividades humanas mais importantes.  Sobre isso ele escreveu: “(...) uma verdade objetiva não é teórica, mas prática. É na práxis que o homem deve demonstrar a verdade, o saber, a efetividade e o poder (...)” (Teses Contra Feuerbach). Aristóteles em uma análise ontológica, afirmou que o ser (em potência), só poderia se transformar em um ser em ato (real) mediante algum movimento, e nos dá como exemplo a semente que carrega em si (em potência) uma árvore, no entanto essa só se afirmará como árvore mediante o ato, o movimento de se “fazer” árvore.
 Concordando com essas afirmações, vemos a necessidade do “ser” em se afirmar como tal, elevando-se de maneira sublime acima do mero “ter”, mas somente a partir de suas realizações, da práxis, do “fazer”, que seria intervir e modificar objetivamente a realidade, efetivando-se como um “ser" social pleno a partir e através de suas ações.